*Julianne Barragan Wagner
O ano é 1996. Soldados angolanos recepcionam os visitantes brasileiros que acabam de desembarcar em Kuito, na Angola. Entre apresentações e cumprimentos, um dos brasileiros corre em busca de seu maior objetivo no momento: urinar. O local escolhido para a higiene pessoal se mostra inapropriado quando Humberto Trezzi repara no cartaz, que avisa: “Perigo. Minas”. Desde então, Trezzi aprendeu que repórteres em área de risco nunca devem pisar em lugares desconhecidos.
A situação, embora quase termine de forma trágica, é retratada com uma pitada de humor por Trezzi no seu
Em Terreno Minado (Geração Editorial, 2013). Dividida em quatro partes, a obra de 343 páginas pode ser comparada a um livro de história – aqueles do Ensino Médio que buscam ensinar o estopim e as consequências de uma guerra – a uma aventura bairrista, com direito a uma aparição de Ronaldinho Gaúcho para livrar o personagem principal de uma encrenca, e a um drama sobre pessoas que sabem se defender de tiros, mas, nada conseguem fazer contra a força da natureza.
Com jogo de cintura e boas fontes, Trezzi guia os leitores pelo caminho tortuoso dos conflitos, das catástrofes, rebeliões políticas e do crime organizado. O trajeto por áreas de conflito quase custou a vida do jornalista. Para os leitores, a visita aos bastidores dos desmoronamentos de 2008 em Santa Catarina, por exemplo, vai custar pouco mais de R$ 30,00. Cada nova situação desperta o espírito competitivo e também compassivo do leitor, que acaba se transformando em personagem na medida em que percebe Trezzi intrigado com questões semelhantes.
O livro é uma abordagem mais pessoal e estendida das reportagens feitas por Trezzi para o jornal Zero Hora. A obra se torna o destino de casos curiosos e fotos impactantes que acabaram não sendo aproveitadas pelo jornalista nas matérias em razão da linha editorial do veículo.
Em Terreno Minado é uma boa pedida para quem gosta de precisão, pois, o jornalista não esconde o que pensa sobre repórteres que abusam do sentimentalismo.
Em meio a bombas e correria, quem diria, pausa para a oração. Através de Trezzi somos informados ou lembrados de que os muçulmanos têm o ritual de orar no mínimo quatro vezes ao dia. E a regra vale também para momentos de tensão, como quando conterrâneos duelam por ideais distintos. Trezzi se mostra observador, e ao mesmo tempo compreensível, quanto às tradições do outro, o diferente. Variados trechos do livro são dedicados às diferenças étnicas mais gritantes.
Trezzi peca quando opta por contar a maioria das histórias em ordem decrescente dos fatos. Apesar de a escolha dar mais ação aos textos, o leitor corre o risco de não conseguir conectar os diferentes fragmentos que, juntos, constroem a história.
Em Terreno Minado é indicado a consagrados correspondentes de guerra, a futuros correspondentes, a aventureiros, a estudantes, a professores. Enfim, a pessoas.
*Acadêmica do 7º semestre do curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc).
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Na foto de Caroline Fagundes, Trezzi autografa os livros dos alunos
de Técnicas de Reportagem, em abril de 2014 |
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